domingo, 15 de abril de 2012

"Muitos acreditam que a cantiga trovadorescas, apenas tiveram suas repercussões na Idade Media, mas ainda hoje, em nossa cultura contemporânea, encontramos vestígios dessa escola literária. Segue abaixo um artigo sobre a musica de Caetano Veloso 'Queixa', onde retoma características das cantigas de amor."


A Lírica Trovadoresca na Música Popular Brasileira
De Maria Alzenir Alves Rabelo Mendes


Na cantiga de amor, o eu-lírico expressa-se na voz masculina, mas dirige-se à musa, referindo-a por “mia senhor” como se ela, na posição senhor feudal, fosse a dona absoluta de sua vontade. Nessa composição poética, a linguagem é mais elaborada por se ambientar no espaço do palácio, onde o trovador, além de prestar honra servil, deve zelar pela reputação da mulher que, geralmente, é casada e de condição superior, sendo, portanto, o objeto do desejo inalcançável do vassalo: 



Um amor assim delicado 

Você pega e despreza 

Não o devia ter despertado 
Ajoelha e não reza 

Dessa coisa que mete medo 
Pela sua grandeza 
Não sou o único culpado 
Disso eu tenho certeza 

Princesa, surpresa, você me arrasou 
Serpente, nem sente que me envenenou 
Senhora, e agora me diga onde eu vou 
Senhora, serpente, princesa 

Um amor assim violento 
Quando torna se mágoa 
É o avesso de um sentimento 
Oceano sem água 

Princesa, surpresa, você me arrasou... 


A canção, “Queixa”, de Caetano Veloso, apresenta componentes formais e temáticos que a inserem na categoria de cantiga de amor. Composta em quadras e redondilhas entrecruzadas, arrematadas por um refrão reforçador do motivo da cantiga: a “coita” do eu-poético pelo amor não merecido, causa do um “penar” já cantado por outros tantos trovadores à moda de D. Diniz: “Tam grave dia que vos conhoci,/ por quanto mal me vem por vós, senhor!” 
A tormenta do vassalo diante da impossibilidade de alcançar seu objeto de desejo, na música de Caetano Veloso, é simbolizada pela “serpente”, metáfora da paixão sedutora à que o eu-lírico sucumbe. O sentimento, antes “delicado”, polido por um código de honra cortês, é agora conflitado entre a superioridade da senhora e a divindade jovial da princesa entre as quais se interpõe um componente de perdição, a carnalidade da mulher, a quem compete parte da culpa por essa “coisa que mete medo”, a paixão inflamada e reprimida, o “avesso do sentimento”, traduzindo um amor fatal.



Referências:

Um comentário:

  1. Muito bom, gente!! Legal ver que as cantigas que estudamos em aula ainda estão bem vivas e em vozes brasileiras :)

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